segunda-feira, 29 de junho de 2015

III ENCONTRO HISTÓRIA, IMAGEM E CULTURA VISUAL: ALGUNS APONTAMENTOS

Estudar a história dos museus significa muito mais do que apenas rever – ou mesmo decorar – datas e personagens importantes em suas histórias. Para estudarmos a história dessas instituições, é necessária uma pré-disposição para refletir sobre os processos de musealização e de articulação entre o museu e o seu contexto sócio-cultural, tendo em vista que essas instituições são fortemente formadas e influenciadas por fatores externos, de ordem política, econômica e social.

Nesse sentido, entendo que foi extremamente enriquecedora a experiência dos acadêmicos da disciplina de História dos Museus e dos Processos Museológicos ao assistirem às apresentações do eixo temática Memória, Educação e Patrimônios Visuais, do III Encontro História, Imagem e Cultura Visual, pois os trabalhos desse evento proporcionaram aos estudantes contato com exemplos de aplicações de diferentes práticas em museus.

Nara Beatriz Witt
O trabalho de Nara Beatriz Witt, intitulado História da Educação e Visualidade: as Lições de coisas e o Museu de História Natural do Colégio Anchieta/Porto Alegre, RS, abriu as apresentações, traçando um panorama a respeito dos museus escolares da cidade de Porto Alegre. É interessante destacarmos, dessa apresentação, a preocupação da autora em estudar esse tipo de instituição, que infelizmente é bem pouco difundida, mesmo em colégios particulares, que dispõe de maiores recursos. Refletindo sobre História, Educação e Museologia, a autora aborda a cultura material escolar e o papel pedagógico do museu, enquanto facilitador da assimilação dos conhecimentos aprendidos pelos alunos em sala de aula.

Ana Celina Figueira da Silva
O trabalho de Ana Celina Figueira da Silva, O Museu e a Construção da Memória de Julio de Castilhos: a preocupação com a imagem, para além de nos apresentar um pouco da história desta importante instituição museológica do Rio Grande do Sul, nos faz refletir sobre a atuação dos museus (focando em seus aspectos imagéticos) enquanto consagradores de uma memória – no caso, a memória de uma personagem política. Nesse sentido, destaco o discurso construído pelo museu, fruto de uma intencionalidade governamental – ou seja, percebemos a integração do museu como mais um artifício utilizado na consagração de memórias. Assim como medalhas, bustos e monumentos cívicos e fúnebres espalhados pela cidade, também o museu desempenhou uma atividade nesse projeto de construção da imagem heróica de Julio de Castilhos.

Museu das Missões
O trabalho de Natália Thielke, intitulado Museu das Missões: narrativas visuais sobre o passado missioneiro, nos apresenta um museu pensado com o intuito de reconstruir a ambiência das reduções jesuíticas – também chamado de “simples abrigo”. A própria estrutura do museu, que tem paredes de vidro, foi projetada com o objetivo de integrá-lo ao ambiente local, especialmente com visão privilegiada para a Igreja de São Miguel. A intenção, desse modo, era projetar o visitante à época das reduções, mas esse ato me soou ambíguo, pois ao mesmo tempo em que o museu objetiva construir uma ambiência das reduções, ele silencia personagens centrais da história local: os índios, que davam a dinâmica ao lugar. Obviamente, os jesuítas eram importantes e seria um equívoco desconsiderá-los, mas silenciar a atuação dos índios é uma forma de construir um discurso hegemônico, em que apenas os poderosos aparecem como atuantes. O fato de o museu ter sido concebido em um contexto em que havia uma intenção de fortalecer a identidade brasileira com Portugal justifica esse viés do museu, mas não o torna menos injusto.

Museu Claustro de San Agustín
A comunicação de Ana Cecilia Escobar Ramirez, chamada Resultados da Investigação Curatorial "Colombia en tiempos de la Gran Guerra”, abordou a pesquisa realizada no Museu Claustro de San Agustín, da Universidade Nacional da Colômbia. O trabalho de Ramirez nos alerta para a importância da pesquisa nas instituições museológicas, através da qual é possível formar exposições tendo como referência os materiais divulgados pela grande mídia. Mais uma vez, o museu desempenha um papel importante na consolidação de uma memória, agora não apenas de uma personagem, mas de um acontecimento que provoca tensões: a guerra.

Museu de Arte de São Paulo
Priscila Leonel de Medeiros Pereira apresentou o trabalho Ir, Ver e se Apropriar, relato do projeto “40 Museus em 40 Semanas”, realizado na cidade de São Paulo e que objetivou levar pessoas para conhecer museus da metrópole ao longo de um ano. A apropriação do patrimônio e da memória é o foco da comunicação da autora, que evidenciou a importância do acesso físico e simbólico a esses espaços. Desse modo, a visitação aberta não é apenas destacada como importante para a apropriação do patrimônio, mas também para a valoração do museu enquanto instituição a serviço da população, pois o indivíduo só dará valor ao museu se o conhecer e se sentir pertencente ao seu espaço, incluído em suas atividades e representado enquanto cidadão. A mediação realizada pela instituição, nesse sentido, é a palavra-chave para a valorização dos museus.

Zita Rosane Possamai
Por fim, Zita Rosane Possamai apresentou a comunicação A Educação em Exposição: o Palácio da Educação na Exposição Universal de Paris, 1900, em que abordou as imagens do Palácio da Educação, onde foram reunidos materiais relacionados às práticas de ensino de diversos países. A Educação, mais uma vez, está no centro da questão, agora não abrangendo o caráter pedagógico dos museus, mas sim o museu construindo discursos sobre a Educação, o progresso e a modernização tecnológica. O objetivo dos materiais expostos era dar a ver o cotidiano da vida escolar. Destaco, dessa apresentação, o entusiasmo que percebemos na construção e no discurso de exposições como esta, que ressaltam determinados aspectos da vida cotidiana e, mais que isso, as mudanças pelas quais passa a sociedade, pois trata justamente de contrapor o passado e o presente da Educação, verificando as transformações pelas quais passou a Educação.


A diversidade de perspectivas e práticas museológicas é enriquecida quando percebemos que cada trabalho trouxe um museu diferente de uma localidade distinta, pois houve estudos sobre museus de Porto Alegre (Museu Júlio de Castilhos e Museu do Colégio Anchieta), do Rio Grande do Sul (Museu das Missões), de São Paulo (museus visitados no projeto 40 Museus em 40 Semanas) e mesmo internacionais (o caso do Museu Claustro de San Agustín e da Exposição Universal de Paris). Desse modo, compreendo que foi de grande valia essa experiência, pois facilitou a assimilação dos estudantes da disciplina no que tange à história dos museus, ao apresentar a multiplicidade de atividades e discursos realizados por essas instituições, tanto antigamente como na contemporaneidade.