Estudar a história dos museus significa muito mais
do que apenas rever – ou mesmo decorar – datas e personagens importantes em
suas histórias. Para estudarmos a história dessas instituições, é necessária
uma pré-disposição para refletir sobre os processos de musealização e de
articulação entre o museu e o seu contexto sócio-cultural, tendo em vista que
essas instituições são fortemente formadas e influenciadas por fatores
externos, de ordem política, econômica e social.
Nesse sentido, entendo que foi extremamente
enriquecedora a experiência dos acadêmicos da disciplina de História dos Museus
e dos Processos Museológicos ao assistirem às apresentações do eixo temática Memória, Educação e Patrimônios Visuais,
do III Encontro História, Imagem e
Cultura Visual, pois os trabalhos desse evento proporcionaram aos
estudantes contato com exemplos de aplicações de diferentes práticas em museus.
Nara Beatriz Witt |
O trabalho de Nara Beatriz Witt, intitulado História da Educação e Visualidade: as
Lições de coisas e o Museu de História Natural do Colégio Anchieta/Porto
Alegre, RS, abriu as apresentações, traçando um panorama a respeito dos
museus escolares da cidade de Porto Alegre. É interessante destacarmos, dessa
apresentação, a preocupação da autora em estudar esse tipo de instituição, que infelizmente
é bem pouco difundida, mesmo em colégios particulares, que dispõe de maiores
recursos. Refletindo sobre História, Educação e Museologia, a autora aborda a
cultura material escolar e o papel pedagógico do museu, enquanto facilitador da
assimilação dos conhecimentos aprendidos pelos alunos em sala de aula.
Ana Celina Figueira da Silva |
O trabalho de Ana Celina Figueira da Silva, O Museu e a Construção da Memória de Julio
de Castilhos: a preocupação com a imagem, para além de nos apresentar um
pouco da história desta importante instituição museológica do Rio Grande do
Sul, nos faz refletir sobre a atuação dos museus (focando em seus aspectos imagéticos)
enquanto consagradores de uma memória – no caso, a memória de uma personagem
política. Nesse sentido, destaco o discurso construído pelo museu, fruto de uma
intencionalidade governamental – ou seja, percebemos a integração do museu como
mais um artifício utilizado na consagração de memórias. Assim como medalhas,
bustos e monumentos cívicos e fúnebres espalhados pela cidade, também o museu
desempenhou uma atividade nesse projeto de construção da imagem heróica de
Julio de Castilhos.
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Museu das Missões |
O trabalho de Natália Thielke, intitulado Museu das Missões: narrativas visuais sobre
o passado missioneiro, nos apresenta um museu pensado com o intuito de
reconstruir a ambiência das reduções jesuíticas – também chamado de “simples
abrigo”. A própria estrutura do museu, que tem paredes de vidro, foi projetada
com o objetivo de integrá-lo ao ambiente local, especialmente com visão
privilegiada para a Igreja de São Miguel. A intenção, desse modo, era projetar
o visitante à época das reduções, mas esse ato me soou ambíguo, pois ao mesmo
tempo em que o museu objetiva construir uma ambiência das reduções, ele
silencia personagens centrais da história local: os índios, que davam a
dinâmica ao lugar. Obviamente, os jesuítas eram importantes e seria um equívoco
desconsiderá-los, mas silenciar a atuação dos índios é uma forma de construir
um discurso hegemônico, em que apenas os poderosos aparecem como atuantes. O
fato de o museu ter sido concebido em um contexto em que havia uma intenção de
fortalecer a identidade brasileira com Portugal justifica esse viés do museu,
mas não o torna menos injusto.
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Museu Claustro de San Agustín |
A comunicação de Ana Cecilia Escobar Ramirez, chamada
Resultados da Investigação Curatorial
"Colombia en tiempos de la Gran Guerra”, abordou a pesquisa realizada
no Museu Claustro de San Agustín, da Universidade Nacional da Colômbia. O
trabalho de Ramirez nos alerta para a importância da pesquisa nas instituições
museológicas, através da qual é possível formar exposições tendo como
referência os materiais divulgados pela grande mídia. Mais uma vez, o museu
desempenha um papel importante na consolidação de uma memória, agora não apenas
de uma personagem, mas de um acontecimento que provoca tensões: a guerra.
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Museu de Arte de São Paulo |
Priscila Leonel de Medeiros Pereira apresentou o
trabalho Ir, Ver e se Apropriar, relato
do projeto “40 Museus em 40 Semanas”, realizado na cidade de São Paulo e que
objetivou levar pessoas para conhecer museus da metrópole ao longo de um ano. A
apropriação do patrimônio e da memória é o foco da comunicação da autora, que
evidenciou a importância do acesso físico e simbólico a esses espaços. Desse
modo, a visitação aberta não é apenas destacada como importante para a
apropriação do patrimônio, mas também para a valoração do museu enquanto
instituição a serviço da população, pois o indivíduo só dará valor ao museu se
o conhecer e se sentir pertencente ao seu espaço, incluído em suas atividades e
representado enquanto cidadão. A mediação realizada pela instituição, nesse
sentido, é a palavra-chave para a valorização dos museus.
Zita Rosane Possamai |
Por fim, Zita Rosane Possamai apresentou a
comunicação A Educação em Exposição: o
Palácio da Educação na Exposição Universal de Paris, 1900, em que abordou
as imagens do Palácio da Educação, onde foram reunidos materiais relacionados
às práticas de ensino de diversos países. A Educação, mais uma vez, está no
centro da questão, agora não abrangendo o caráter pedagógico dos museus, mas sim
o museu construindo discursos sobre a Educação, o progresso e a modernização
tecnológica. O objetivo dos materiais expostos era dar a ver o cotidiano da
vida escolar. Destaco, dessa apresentação, o entusiasmo que percebemos na
construção e no discurso de exposições como esta, que ressaltam determinados
aspectos da vida cotidiana e, mais que isso, as mudanças pelas quais passa a
sociedade, pois trata justamente de contrapor o passado e o presente da
Educação, verificando as transformações pelas quais passou a Educação.
A diversidade de perspectivas e práticas
museológicas é enriquecida quando percebemos que cada trabalho trouxe um museu
diferente de uma localidade distinta, pois houve estudos sobre museus de Porto
Alegre (Museu Júlio de Castilhos e Museu do Colégio Anchieta), do Rio Grande do
Sul (Museu das Missões), de São Paulo (museus visitados no projeto 40 Museus em
40 Semanas) e mesmo internacionais (o caso do Museu Claustro de San Agustín e da
Exposição Universal de Paris). Desse modo, compreendo que foi de grande valia
essa experiência, pois facilitou a assimilação dos estudantes da disciplina no que
tange à história dos museus, ao apresentar a multiplicidade de atividades e
discursos realizados por essas instituições, tanto antigamente como na contemporaneidade.
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